sábado, 29 de janeiro de 2011

Para que tanto sexo?

Bill Masters morreu em 2001, com 85 anos. Seu legado está exposto acima. Cinqüenta anos depois de suas pesquisas pioneiras com pênis de plástico, remédios resolvem impotência, a fisiologia feminina foi mapeada, a ciência passou a olhar a sério para as práticas sexuais do Oriente. Fala-se cada vez mais abertamente sobre sexo. Em resumo, o mundo está melhor.
Será?
“A pesquisa de Masters era basicamente sobre novos modos de medir a performance física – o que ajudou a nos colocar no caminho da pesquisa do sexo mecânico: a viagrificação das relações sexuais”, escreveu Leonore Tiefer, talvez a maior sexóloga viva, que apelidou Masters de “Vasco da Gama da vagina interior”. Leonore é uma feminista e está incomodada com os rumos do mundo. Mas... Uma feminista criticando o legado de Masters? Não foi ele que transformou o orgasmo em um direito da mulher? “A confiança de Masters na biologia evoluiu para uma forma bem americana de pressão pela performance sexual – pelo orgasmo a qualquer custo”, afirma ela. Orgasmo não é mais um direito. É um dever.
As manchetes nas revistas, todos os meses anunciando uma novidade imperdível, vão virando imposições. É como se a mulher incapaz de gozar fosse menos mulher – inadequada, ultrapassada, reprimida. O homem que não tem orgasmos múltiplos ou não é tântrico é um inapto. Pessoas com vidas sexuais normais e satisfatórias têm visitado terapeutas reclamando que não conseguem ter orgasmos simultâneos. A cobrança vai enchendo os relacionamentos de mágoa e tirando a naturalidade do sexo. Homens ficam frustrados ao não verem suas parceiras ejacularem, como nos livros. As mulheres os acusam de não serem eficientes na estimulação do seu ponto G. A busca de prazeres cada vez maiores, de orgasmos novos e mais estremecedores virou uma corrida. E criou um novo problema sexual.
Problema que adquire dimensões trágicas em fenômenos como a proliferação das clínicas de cirurgia para aumentar o pênis. “Nunca vi um caso bem-sucedido de cirurgia para aumento peniano”, diz Eric Wroclawski, presidente da Sociedade Brasileira de Urologia. “Vejo sim pacientes com cicatrizes horrorosas, que perderam a sensibilidade.” As cirurgias, que implicam ou a adição de tecido gorduroso na glande, para aumentar seu volume, ou a soltura da base do pênis, para que ele fique mais “para fora”, têm inúmeros efeitos colaterais. Entre eles, a perda do vigor da ereção e a sensação de que o pênis está “solto” do corpo.
Tudo isso se deve em parte à confiança exacerbada que se espalhou pelo mundo na era do Viagra. Ficou parecendo que, com os avanços da ciência, tudo é possível. Que todos os problemas sexuais têm solução. A verdade é que, embora a ciência do sexo seja fascinante, aquilo que acontece na cama, entre duas pessoas, não mudou tanto assim. “As pessoas estão lutando com as mesmas questões de sempre. Sexo está tão difícil quanto sempre foi”, diz Joannides.
E talvez a solução para a maior parte dos problemas sexuais seja aquela conhecida desde que o mundo é mundo. “O importante em sexo é não ser egoísta. Você tem que prestar atenção no outro”, diz Maria do Carmo. É dessa atenção mútua que a obsessão por performance pode nos afastar. Orgasmo é bom. Mas é só um dos momentos da relação sexual. O foco total no clímax vai tirando o prazer da descoberta, da experimentação, que são as chaves de uma vida sexual feliz.
Sexo se faz a dois (ok, não necessariamente a dois, pode ser a três ou quatro). Normalmente é num quarto fechado, longe do debate público, das promessas da indústria farmacêutica, dos ensinamentos dos mestres da ioga, das pesquisas dos laboratórios, desta Super que vos fala. O que acontece por lá é assunto só seu e de quem está com você. Se o Viagra ou o kung fu sexual tornam aquilo mais gostoso e mais satisfatório, ótimo. Se você tem prazer sem nada disso, parabéns. Se não faz sexo nunca ou quase nunca, mas tira de algum outro lugar o conforto para seguir vivendo sem muito estresse – como acontece com muitas pessoas sincera e profundamente religiosas ou com aqueles que se satisfazem com orgasmos intelectuais –, fique à vontade. Já passamos tempo demais tendo que ouvir os outros nos dizerem o que fazer na cama.
fonte

Um comentário:

  1. Silvana
    O seu post está muito bom, mas a última frase define a obsessão neurótica que grassa na sociedade atual, em que existe sempre um iluminado que nos diz como nos satisfazer.
    Isso não é evolução, mas decadência.
    Um abraço

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Silvana Marmo